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Intenções de Imigrar em Tempos de Covid

Entre a Esperança e a Realidade

Por Hewton Tavares | Publicado 12/08/2020

A  gravidade da pandemia do Coronavírus exige que eu hoje tenha uma postura mais compassiva e menos impessoal. Esta necessidade surge em nome dos milhares de imigrantes que estão agora em um compasso da espera ao verem os seus sonhos de imigrar para o Canadá correrem grande perigo. E é justamente por causa disto que prossigo com este artigo agora em um tom mais pessoal e menos jornalístico do que o de costume.

A ESPERANÇA DOS BRASILEIROS EM PARTICULAR

Em março deste ano criei um grupo apenas de brasileiros na mídia social. A maior parte deles reside no Canadá e um outro menor grupo se encontra no Brasil, tendo a intenção de vir morar temporária ou permanentemente aqui.

Em resposta a  minha sondagem sobre a intenção deste último grupo em imigrar, tive a surpresa de identificar o otimismo deles. Na hora, interpretei esta resposta em particular como uma característica cultural muito própria dos brasileiros. Bem no estilo do dizer ‘a esperança é a última que morre’. Pareciam assim acreditar que existiriam atrasos nos seus processos de imigração e que bastava apenas ter paciência em decorrência deles.

Fiquei atônito com este feedback. Me senti assim  não só devido à minha própria história (cheguei no  Canadá um pouco antes do ataque às Torres Gêmeas), mas também pelo que tenho acompanhado no decorrer dos anos.  Tenho visto a aflição de muitos outros em relação à demora dos seus processos de imigração.

A EXPECTATIVA DOS IMIGRANTES 

Em junho, a World Education Services (WES) emitiu relatório sinalizando a mesma tendência surpreendentemente registrada entre os brasileiros do meu próprio grupo. Mundialmente, indivíduos com intenção em vir para o Canadá ainda se mostravam moderadamente otimistas.

57% dos respondentes revelavam que o Covid não mudava o desejo deles em imigrar. No entanto, 42% já admitiam que haveria demoras. Percebi ali uma pequena diferença em relação à minha própria pesquisa informal feita sem nenhuma base estatística. De um jeito ou de outro, uma parcela bem significativa ainda não parecia mesmo ter perdido a esperança.

A pesquisa global da WES também captou que  38% por cento dos entrevistavam acreditavam que o Covid deterioraria o mercado de trabalho nos seus países de origem de uma forma acelerada. E, infelizmente, o Brasil parece ser hoje um bom exemplo desta dura realidade.

E AGORA JOSÉ?

Em preparação para este artigo, decidi mais uma vez sondar os ‘ânimos’ dentro do meu grupo. Só que desta vez, eu não fiz uma pesquisa tão abrangente. Resolvi apenas perguntar mais detalhes sobre a situação atual de alguns dos participantes.  Identifiquei neste segundo levantamento que o dominante otimismo inicial já vem ‘temperado’ agora pela ação do tempo.

A advogada Emilia Albuquerque, por exemplo, sempre teve o sonho de vir morar em Toronto. “Amooooo o Canada de paixão. Todo ano eu vou”. Só que neste ano, Emilia e o marido já tiveram que postergar a viagem anual de julho para outubro.

Já a programadora Camila Fassarella (foto) parece sentir o impacto da pandemia no seu plano de imigração com mais força. A sua meta inicial de chegar em Ottawa até outubro já lhe parece um pouco distante, pois os locais que realizam as biometrias no Brasil se encontram ainda fechados. Mesmo assim, Camila se vê agora em um verdadeiro impasse: “Vendo tudo? Procuro emprego novo?”

Por fim, acredito eu que o dilema do psicólogo Wildson Sartori é ainda mais pungente. Ele e o marido se encontram de mãos atadas, pois já venderam muitos dos seus pertences pessoais e também já deixaram os respectivos empregos. E agora Wildson ainda anda às voltas com o impacto psicológico gerado por toda a situação. “O mais difícil é controlar a ansiedade”, confessa ele.

POSIÇÃO OFICIAL

Os imigrantes em potencial sofrem não só com os muitos efeitos da pandemia, mas também com a falta de uma maior flexibilização em torno dos processos de imigração para o Canadá. Neste meio tempo, a posição oficial do governo parece se basear em ‘wishful thinking’, como se costuma falar em inglês. Ou seja, já não aparenta ser completamente pautada na realidade.

De acordo com uma reportagem recente no jornal Canadense Globe and Mail, o ministro de imigração Marco Mendocino ainda se mostra totalmente comprometido com o seu alvo inicial de trazer 341.000 imigrantes ao Canadá neste ano. Mas segundo a mesma reportagem, foram admitidos apenas 84.000 durante todo o primeiro semestre de 2020. Já os muitos sonhos reais de vários imigrantes seguem ainda em compasso de espera.

Mas será que todo este descompasso é apenas culpa do Covid? Talvez seja mesmo muito ingênuo colocar toda a culpa no tão famoso vírus…

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Hewton Tavares

Hewton é pesquisador com mestrado e doutorado em educação pela Universidade de Toronto. Nos seus quase 20 anos no Canadá, ele tem sido um ativo participante dos mais variados projetos profissionais, voluntários e acadêmicos em prol da integração de imigrantes e auxílio a estudantes internacionais e defensor do avanço da justiça social através da educação.

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