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Quando a paixão promove respeito à diversidade

Por Sandro Rego

Paixão sem limites

Na coluna passada, falei sobre a paixão que o canadense tem por esportes. Muitas vezes essa paixão não tem limites. Recém-chegado ao Canadá, assistindo a uma partida do Toronto Raptors, o time de basquete da cidade que disputa a NBA, a principal liga de basquete do mundo, eu reparei que um torcedor, na beira da quadra, sempre estava mais empolgado que os demais. Não parava de pular um instante, gesticulava horrores, vibrava a cada cesta e reclamava a cada marcação do árbitro para o time adversário. Pensei comigo: deve ser empolgação de quem está assistindo a uma partida pela primeira vez na beira da quadra. No segundo jogo que assisti lá estava ele, no mesmo lugar com o mesmo comportamento. E ele continua lá, a cada partida, com a mesma energia.

Texto 2_Nav Bhatia_Arquivo Pessoal


Foto: Nav Bhatia_Arquivo Pessoal

Curioso, fui procurar saber quem era a figura que batia ponto em todos os jogos do Raptors no Air Canada Centre. Trata-se do empresário indiano Nav Bhatia, de 65 anos. Ele imigrou para o Canadá com sua esposa em 1984 para escapar das violentas perseguições aos Sikhs, seguidores da religião monoteísta que surgiu no século XV no Punjabe, na divisa da Índia e o Paquistão. Chegou com muito pouco recurso financeiro e, segundo ele, naquele tempo, sofreu discriminação na busca por emprego por usar barba e turbante. Recentemente em uma entrevista a um jornal local, Bhatia disse que “fez mais de 300 entrevistas” até ser contratado por uma concessionária de veículos.

Nos primeiros três meses vendeu 127 carros. Um recorde até hoje. Com sua simpatia, carisma e competência foi subindo na hierarquia da empresa. Hoje é dono de duas concessionárias de veículos em Ontário. Em 1995 comprou seus primeiros dois ingressos para um jogo dos Raptors. Era o que o dinheiro deu para comprar. A paixão pelo time começou aí e só foi aumentando na medida que o empresário prosperava. Bhatia não perde uma partida do time em casa há mais de 20 anos. Hoje, ele tem 10 assentos na arena (seis deles na beira da quadra) e quatro nos camarotes para toda temporada.

Ingressos acessíveis às crianças da comunidade Sikh

Além disso compra milhares de ingressos para crianças assistirem aos jogos. Anualmente investe mais de 300 mil dólares canadenses (perto de R$ 1 milhão) só em ingressos. Não à toa, em 1999 foi nomeado por Isiah Thomas, ex-jogador e executivo dos Raptors, como “Superfã” e embaixador do time, junto com o rapper canadense Drake.

Os cerca de 3.000 ingressos que compra anualmente são destinados às crianças da comunidade Sikh e de outras minorias. Foi a forma que Nav Bhatia encontrou de inserir essas pessoas à sociedade canadense. “Não quero que as crianças Sikh passem pelo que eu passei. Nós somos diferentes fisicamente mas temos as mesmas paixões”, disse ele que usa o basquete como ferramenta para integração social e para aumentar o respeito à diversidade.

Então, da próxima vez que você assistir a uma partida do Toronto Raptors pela TV, repare do lado direito da quadra, sob a tabela, em um homem com barba e turbante, gesticulando e torcendo sem parar. Além de um superfã você verá também um super-humano.

Sandro Rego

Sandro é Jornalista com especialização em Comunicação Empresarial. No Brasil, trabalhou em empresas como Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Bunge, Grupo Boticário e Banco Safra. Em 2014 foi eleito “Comunicador do Ano” pela Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial). No Canadá, estuda Business Management na Universidade de Toronto.

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